segunda-feira, janeiro 16, 2006

MULHOLLAND DRIVE - David Lynch


Mulholland Drive/Mulholland Dr. Realizado por David Lynch França/EUA, 2001
Com: Justin Theroux, Naomi Watts, Laura Elena Harring, Ann Miller, Dan Hedaya, Mark Pellegrino, Brent Briscoe, Robert Forester, Katharine Towne, Lee Grant
Rita (Harring), procura a memória perdida, ao mesmo tempo que tenta perceber porque é que alguém anda à sua procura, com intenções de a matar. Betty (Watts), uma jovem mulher recém-chegada a Los Angeles, com intenções de se estabelecer como actriz, vai ajudá-la na investigação.
Adam Kesher (Theroux) é um realizador de cinema a quem é imposta uma actriz para o papel principal do seu novo filme. A recusa tem consequências drásticas no seu bem-estar físico e económico. Mistérios insondáveis da mente humana – de Lynch ou de uma das suas personagens – envolvem o principal fluxo narrativo, adicionando ingredientes como um estranho cowboy, um night-club que, numa aparente redundância, encena o artificial ou sonhos de outrem, sobre o terror escondido nas sombras das traseiras de um café.
As primeiras ideias sobre a decisão de David Lynch:
«Mulholland Dr.» foi concebido como um episódio piloto de cerca de duas horas, destinado a ser exibido pela cadeia norte-americana ABC, no Outono de 1999. Lynch resistiu o que pode, mas concluiu que o “controle criativo” que lhe era atribuído por contracto, vinculava a produtora, mas não a ABC, a qual poderia recusar o produto ou exigir alterações. Na prática, não detinha o “final cut”. Assim, mesmo depois do realizador efectuar uma montagem em que sentiu estar a trair a sua obra – consolado com a recuperação do material extirpado no desenvolvimento da série – a ABC viria a rejeitar o piloto, considerando eventualmente transformá-lo num telefilme, além de o projectar em salas de cinema europeias (algo que estava previsto inicialmente no contrato).
O descalabro do projecto ocorreu por altura da exibição de «The Straight Story» (1999) em Cannes. Os produtores franceses desse filme, Alain Sarde e Pierre Edelman, viram o piloto de “Mulholland Drive” e quiseram transformá-lo num filme, reunindo para tal mais 7 milhões de dólares. Sob a asa da Studio Canal, que adquiriu os direitos, Lynch revisitaria a história dois anos depois, acrescentando cenas, voltando a filmar outras e concebendo uma conclusão inteiramente nova. O filme estreou nos EUA distribuído pela Universal.
Apesar dos contratempos em redor da criação de «Mulholland Dr.», o objecto finalizado para projecção em salas de cinema não denota a existência de quaisquer espécie de “remendos”. O estilo narrativo de David Lynch, fundado numa lógica que se recusa a distinguir o real do imaginado, aliado a uma estrutura que subverte a lógica linear temporal, polvilhado por flashbacks e flashforwards, visões, pesadelos, sonhos dentro de sonhos e abstracções sem aparente resolução, mostrou ser o ideal para tal conversão.
O levantar pleno da cortina também pode não ser desejável, pois o realizador prefere despejar pistas atrás de pistas, para que o espectador as recolha e tente formar a sua própria visão (coerente?) dos acontecimentos. No final, em vez de clarificar, Lynch deixa-nos a reflectir sobre o que vimos, enquanto tentamos amarrar o maior número de pontas soltas.

9 Comments:

At 17/1/06 10:00, Blogger Diafragma said...

A cena do "terror escondido" nas trazeiras do café e em plena luz do sol, é do melhor suspense que já vi, de fazer inveja a um Hitchcock. Um espanto. O desempenho das duas actrizes é magistral.
Resta-me agradecer este post, feito "a pedido"!

 
At 17/1/06 11:58, Blogger peciscas said...

Ora aí está como por de trás de um filme há voltas e reviravoltas de que muitas vezes o espectador não suspeita.

 
At 17/1/06 14:05, Blogger A .Carlos said...

Ola Kalinka
Comentar Lynch, nunca me pareceu uma coisa fácil, mas o teu inegavel
espirito de análise, consegue-o fazer.
Excelente
Bjs
:)

 
At 17/1/06 17:08, Blogger Amaral said...

Estás a "entregar" as tuas faculdades para a crítica de cinema, que as revistas especializadas haveriam de apreciar… Lendo o que escreves, ficamos com uma ideia do filme mas, mais do que isso, ficamos a conhecer algo mais dos seus autores… Muito bem!

 
At 17/1/06 18:39, Anonymous Anónimo said...

KALINKA: as primeiras palavras são para desejar que Contigo, em termos de saúde, tudo continue no melhor caminho, p/a tua total recuperação; agora, qd entrei fui agradavelmente surpreendida com a tua música,sempre tentando,só hoje consegui ouvir e gostei muito; fazer qq coméntário aos teus artigos, só para te dizer que és uma pessoa espectacular e tem sido sempre com mt agrado e total admiração que leio os teus artigos!
Uma boa semana! Bjs. Ju

 
At 17/1/06 20:04, Blogger Pink said...

Interessante este post que, além de nos falar de um filme, nos conta os meandros da sua criação que neste caso nada têm de lineares ou simples.

Um beijo

 
At 17/1/06 23:19, Blogger Mocho Falante said...

não vi o filme...mas aguçou-me o apetite...já volto, vou dar um saltinho ao blockbuster

Beijocas

 
At 18/1/06 09:56, Blogger Isabel Filipe said...

...despertaste a minha curiosidade e fiquei com vontade de ver...sabes se ainda está em cartaz?

beijokas

 
At 18/1/06 21:26, Blogger lena said...

Kalinka, fui ler o teu comentário, és tu a menina das palavras que fazem este blog ser especial, as tuas partilhas são sempre excelentes e interessantes, por isso me prendem
o post de hoje é de uma análise tão profunda que de o ler fiquei com uma idéia geral do filme bem como dos seus autores, acredita que há muitas revistas especializadas que não conseguem transmitir o que aqui partilhaste,
fiquei curiosa, não conhecia o filme e não o vou perder

a minha cabana está lá, serás sempre bem vinda, mas acredita não tem a grandeza deste teu cantinho,
obrigada pelas tuas visitas que adorei e volta lá sempre

beijinhos meus

lena

 

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